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quinta-feira, fevereiro 27, 2025
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Ananindeua: Decisão do TCM obriga Prefeitura a cancelar licitação

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Pela terceira vez em menos de um mês, a Prefeitura de Ananindeua revogou uma licitação milionária para a coleta de lixo. Com um valor de cerca de R$ 180 milhões, ela representa R$ 100 milhões a mais do que a última licitação, realizada em 2023, ou a menos de dois anos. Hoje, os contratos das empresas Recicle e Terraplena, para a coleta do lixo, somam menos de R$ 80 milhões anuais. A revogação foi publicada pela Seurb, a secretaria municipal de Serviços Urbanos, no Diário Oficial do Município, do último dia 24. E foi motivada por uma decisão unânime dos conselheiros do Tribunal de Contas dos Municípios do Pará (TCMPA). No dia 23, eles mantiveram a determinação para que o certame fosse suspenso, devido aos indícios de irregularidades detectados pelos técnicos do tribunal: “graves infrações” à Constituição Federal e a várias leis, “bem como aos princípios da legalidade, economicidade, eficiência e moralidade”, com possibilidade de prejuízos aos cofres públicos.

Mas no Diário Oficial a Seurb não menciona a decisão do tribunal: diz apenas que a licitação foi revogada “por razões de conveniência e oportunidade”. Até a noite de ontem, aliás, a revogação não se encontrava no portal da Transparência: só estava disponível no site do TCMPA. E lá, em meio à papelada do processo, a Seurb admite que revogou a licitação devido à ordem do tribunal para que o certame fosse suspenso “para análise de irregularidades”. É a terceira vez que a licitação emperra. Na primeira, a própria Prefeitura decidiu revogá-la, porque impugnações contra o Edital obrigaram a “alterações significativas” em peças fundamentais do processo. Na segunda, foi revogada por recomendação do TCM, que recebera uma denúncia de irregularidades. Agora, nessa terceira versão, foi suspensa, no último dia 14, por ordem do conselheiro Antonio José Guimarães, após um pedido dos técnicos do tribunal. Foi essa decisão que foi “homologada” (confirmada) pelos demais conselheiros do TCMPA, no último dia 23, ao manterem a suspensão.



Irregularidades

Segundo os técnicos, essa licitação contraria uma série de leis. A começar pelo artigo 37 da Constituição Federal, que determina que a administração pública obedeça aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Também fere o artigo 5º da Lei das Licitações 14.133/2021, que determina que as licitações e contratos do Poder Público obedeçam aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, do interesse público, probidade administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável. Não bastasse isso, também contraria o artigo 23 da Lei 8987/1995, que estabelece as muitas cláusulas que os contratos de concessão de serviços pelo Poder Público têm de conter.

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Todas essas irregularidades, segundo os técnicos, decorrem do fato de a Prefeitura estar tentando realizar uma licitação para a contratação “ordinária” (comum) de empresas para a coleta do lixo, quando a licitação deveria ser para a concessão do serviço público de gestão do lixo. Porque, argumentam eles, a concessão desse tipo de serviço é exigência da Lei 14.026/2020, que trata sobre o saneamento básico, do qual a coleta e tratamento do lixo faz parte. Os técnicos não dizem, mas é possível que a insistência da Prefeitura em uma licitação mais simples decorra da intenção de beneficiar a Norte Ambiental Gestão e Serviços Ltda (CNPJ: 10.944.348/0001-90), empresa pertencente ao empresário Cleiton Teodoro da Fonseca, que é amigo do prefeito.

Certame seria um possível jogo de cartas marcadas para beneficiar a Norte Ambiental

Como mostrou o DIÁRIO, há fortes suspeitas de que esse certame seria “um jogo de cartas marcadas”, para entregar à Norte Ambiental uma fatia generosa da coleta de lixo. No último dia 14, por exemplo, um caminhão da empresa foi até flagrado recolhendo lixo, pela manhã, nas áreas do Icuí-Guajará e Icuí-Laranjeira. Os uniformes dos trabalhadores traziam a logomarca da Seurb. Já o caminhão não possuía qualquer identificação da empresa. Mas a placa dele (TJQ4J12) permitiu constatar que pertence à Norte Ambiental. O problema é que essa empresa não possui contrato com a Prefeitura para a coleta de lixo. O único contrato dela é para a recuperação e manutenção de “vias de Ananindeua”.

SUMIU TUDO!

No portal da Transparência, os únicos pagamentos para ela são por causa desse contrato. Que, aliás, foi firmado pelo então secretário municipal de Saneamento, Paulo Roberto Cavallero de Macedo, afastado do cargo pela Justiça, no ano passado, por suspeita de ligação a uma quadrilha que fraudou mais de R$ 100 milhões em licitações.

O extrato do contrato 068/2022, entre a Norte Ambiental e a Sesan, a secretaria municipal de Saneamento de Ananindeua, foi publicado no Diário Oficial do Município (DOM), de 27/10/2022. O valor era de até R$ 48 milhões anuais, para fornecimento e aplicação de CBUQ (um tipo de asfalto), em ruas da cidade. Mas, para realizar esse contrato, a Sesan não realizou uma licitação própria: ela usou uma Ata de Registro de Preço (SRP 019/2022) de uma Concorrência Pública (CP 001/2022) da Prefeitura de Abaetetuba. E o problema é que o DIÁRIO não conseguiu encontrar nem essa Ata e Concorrência de Abaetetuba, nem o processo de contratação da Norte Ambiental pela Sesan. Não foram localizados documentos nos portais da Transparência desses municípios, no mural das licitações do TCMPA e no portal das licitações. E até no Google os links que levavam a esses documentos tiveram as suas páginas apagadas.

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Carona em helicóptero

  •  Não bastasse isso, o prefeito tem sido visto circulando pelo estado em um avião da Norte Ambiental. E o DIÁRIO já obteve até um vídeo de uma dessas viagens. Ela ocorreu durante a campanha eleitoral do ano passado. O vídeo mostra Daniel desembarcando do avião e sendo recebido por manifestantes da campanha de um candidato a prefeito. O local seria o município de Soure, na Ilha do Marajó.
  •  O avião, PT-GJM, fabricado pela Hawker Beechcraft, ano 2007, modelo G58, foi comprado pela empresa, em setembro de 2024 (às vésperas das eleições), por R$ 5,2 milhões, do Hospital Modelo, de Ananindeua. Outro fato que chama atenção é a própria história da Norte Ambiental, que possui algumas características mais comumente encontradas em empresas de fachada. Como é o caso das várias mudanças de nome e endereço e de uma quantidade extraordinária de atividades.



Do comércio de combustíveis e lubrificantes a mais de 40 atividades secundárias

Quando foi aberta, em maio de 2009, ela se chamava Petrolíder Comércio e Transporte de Combustíveis Ltda. Seu endereço era a avenida Transamazônica, no município de Novo Repartimento. Aparentemente, era um posto de gasolina, já que as suas atividades se resumiam ao comércio de combustíveis e lubrificantes. O capital social era de apenas R$ 300 mil (R$ 724 mil atualizados pelo IPCA de dezembro). Os donos eram Cleiton Teodoro da Fonseca e uma empresária de nome Siliane, mas ele detinha 90% do capital e era o administrador. Cinco anos depois, em fevereiro de 2014, a empresa sofreu uma transformação radical: mudou-se para a zona rural de Tucuruí e passou a se chamar Laminar Exportação, Indústria e Comércio Ltda – EPP. Fabricava laminados e vendia madeira e derivados no atacado. Mas também incorporou várias atividades, incluindo terraplenagem, construção de edifícios, aluguel de máquinas, locação de veículos, por exemplo. A sócia Siliane também deixou a empresa. No lugar dela entrou Creuza Felícia Fonseca Damasceno, a mãe de Cleiton. O capital social subiu para R$ 600 mil (R$ 1,1 milhão atualizados), 90% de Cleiton.

CONSTRUÇÃO

Dois anos depois, em fevereiro de 2016, passou a se chamar Norte Maq Empreendimentos Ltda-EPP. As suas atividades se voltaram à construção civil, embora ainda mantivesse várias outras, estranhas a esse segmento, como o transporte escolar. O capital subiu para R$ 3,5 milhões (R$ 5,5 milhões atualizados, ou um aumento real de 400% em 2 anos). Foi só no ano seguinte, em julho de 2017, que passou a se chamar Norte Ambiental Gestão e Serviços Ltda. O capital aumentou para R$ 4,050 milhões (cerca de R$ 6 milhões atualizados), mas continuou a ter como sede o município de Tucuruí.

SECUNDÁRIAS

Hoje, porém, segundo a Receita Federal, a empresa possui um capital de R$ 20 milhões e fica no município de Marituba. Sua principal atividade agora é a coleta de resíduos não-perigosos. No entanto, também possui mais de 40 atividades secundárias: fabrica artefatos de cimento, faz manutenção e reparação de tratores, gera e comercializa energia elétrica, constrói edifícios, rodovias, ferrovias, barragens, redes de água e esgoto; faz pintura e sinalização de rodovias e aeroportos, terraplenagem, instalação de equipamentos de iluminação em vias públicas, portos e aeroportos; perfuração e construção de poços de água, aluguel de veículos e embarcações, transporte escolar, compra, venda e aluguel de imóveis próprios, e ainda limpa casas e prédios.

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