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quinta-feira, fevereiro 27, 2025
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Livro mostra conhecimentos e práticas Kayapó no uso de plantas medicinais

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Evidenciar os conhecimentos e as práticas do povo Kayapó relacionadas ao uso de plantas medicinais é o tema central do livro “Mebêngôkre nhõ pidj’y: remédios tradicionais Mebêngôkre-Kayapó”, de autoria de especialistas indígenas da etnia, editado pela etnobotânica Márlia Coelho-Ferreira e pela antropóloga Claudia López Garcés, pesquisadoras do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), está disponível no formato digital no portal da instituição.

Os autores, lideranças indígenas e especialistas-sabedores dos tratamentos tradicionais em saúde Mebêngôkre (Mebêngôkre Djukanê), são: Parityk Kayapó, Kaikwa-re Kayapó, Tabo Kayapó, Takwyri Kayapó, Banhi-re Kayapó, Bekwynhbô Kayapó, Bekwyhngoti Kayapó, Nhakture Kayapó.

A obra, publicada em 2020 no contexto da pandemia de Covid-19 pelo Núcleo Editorial de Livros do Museu Goeldi, é resultado da experiência de pesquisa participativa “Saúde e soberania alimentar entre os Mebêngôkre-Kayapó: conhecimentos, práticas e inovações”, desenvolvida em colaboração com os Mebêngôkre-Kayapó das aldeias Las Casas e Moikarakô, localizadas nas Terras Indígenas Las Casas e Kayapó, respectivamente, na região sudeste do Pará.

Outro resultado do trabalho foi o documentário “Mebengôkre Djukanê”, produzido pelo cinegrafista Banhi-re Kayapó e pelas cientistas do Museu Goeldi, com o intuito de registrar audiovisualmente o trabalho realizado no livro com os conhecimentos e as práticas de especialistas em saúde Mebêngôkre e de mães de família da etnia. No filme, o foco são as experiências individuais e o papel desempenhado por cada um no âmbito da medicina tradicional.

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Lançamento – A divulgação do livro e do documentário foi um dos destaques do I Encontro de Parteiras, Pajés e equipe de Saúde do Distrito Sanitário Especial Indígena – DSEI Kayapó do Pará, no campus da Universidade Estadual do Pará (UEPA), em Redenção, em dezembro de 2024. Segundo a pesquisadora e coorganizadora do livro, Márlia Coelho-Ferreira, o evento veio ao encontro de uma reivindicação de reconhecimento dos especialistas tradicionais que perdurava desde 1986, quando houve a 1ª Conferência Nacional de Saúde Indígena. Somente em 2024 foi criado o grupo de trabalho “Medicinas Indígenas” dentro da Secretaria de Saúde Indígena do Ministério da Saúde (SESAI/MS) para elaborar a proposta de programa em medicinas indígenas no Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, unidade do Sistema Único de Saúde (SasiSUS).

“A divulgação do livro e a exibição do visual “Mebêngôkre Djukanê” nesse Encontro foi providencial, sobretudo porque contou com a participação de representantes de instituições de saúde do Município e do Ministério da Saúde, profissionais da saúde indígena, acadêmicos de medicina e a comunidade mebêngôkre. Ambos os produtos vêm sendo reconhecidos como fundamentais nesse contexto”, enfatiza a etnobotânica.

Obra coletiva – A equipe que realizou o trabalho foi formada pelas pesquisadoras do MPEG responsáveis pela organização do livro e por lideranças indígenas e especialistas-sabedores dos tratamentos tradicionais em saúde Mebêngôkre (Mebêngôkre Djukanê): Parityk Kayapó, Kaikwa-re Kayapó, Tabo Kayapó, Takwyri Kayapó, Banhi-re Kayapó, Bekwynhbô Kayapó, Bekwyhngoti Kayapó, Nhakture Kayapó. Os autores indígenas são dois pajés (wayangá), um raizeiro (me kuté pidjy màre), três mulheres mães de família, o representante, naquela ocasião, do Conselho Indígena de Saúde (CONDISI) junto ao DSEI Kayapó do Pará, em Redenção, e o jovem cinegrafista do quadro do distrito.

Os Kayapó receberam o livro e o documentário com alegria e reconhecimento, pois atendem, de certa maneira, aos anseios pontuados décadas atrás. “Para eles, tanto o livro quanto o documentário são motivo de orgulho, pois, por um lado, participaram ativamente da concepção e elaboração de ambos, dos quais são reconhecidamente autores; por outro, os vêem como um passo inicial e imprescindível para a valorização da medicina tradicional Kayapó ou do ‘Mebêngôkre Djukanê’”, afirma a pesquisadora Márlia Coelho.

A repercussão foi muito positiva aos olhos dos órgãos que apoiaram as produções, nomeadamente a FUNAI (CR de Tucumã e CL de Redenção, e sobretudo o DSEI Kayapó, que vem fazendo a divulgação do trabalho, incentivados pela criação do GT de Medicinais Tradicionais.

O Museu Goeldi e os Mebêngôkre-Kayapó – Os primeiros registros das práticas e saberes tradicionais de plantas medicinais dos Mebêngôkre-Kayapó foram feitos pela etnofarmacóloga Elaine Elisabetsky no Projeto Kayapó, coordenado pelo antropólogo Darrel Posey (in memorian), que foi pesquisador do Museu Goeldi. O projeto permitiu uma profunda compreensão da vida e da estrutura do conhecimento dos Mebêngôkre.

O início do trabalho foi na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), onde Darrell Posey era professor. Em 1986, já contratado pelo Museu Goeldi, estabeleceu o Núcleo de Etnobiologia e reformulou o projeto ampliando a rede científica, com foco nos processos de mudanças causados no ambiente pela presença indígena e suas práticas de manejo. O intuito final era utilizar o conhecimento indígena sobre plantas e animais úteis em projetos de manejo sustentável de recursos nos Territórios Indígenas e áreas vizinhas em estado de degradação ou desmatadas pela pecuária, mineração e pela extração de madeira.

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No artigo científico “Para além do colonialismo: a sinuosa confluência entre o Museu Goeldi e os Mebêngôkre”, de autoria de Nelson Sanjad, Claudia Leonor López-Garcés e Roberto Araújo, pesquisadores e pesquisadora do Museu Goeldi, Matheus Camilo Coelho (UFPA) e Pascale de Robert (IRD-FR), e publicado na revista Anais do Museu Paulista, é recuperado o histórico da relação entre os indígenas e a instituição. A partir do século XXI foi originada uma colaboração em museologia participativa expandida também para outras categorias patrimoniais. Através de pesquisas etnobotânicas realizadas nos territórios Mebêngôkre foram coletadas amostras que, posteriormente, foram identificadas e depositadas no Herbário João Murça Pires, do MPEG.

A prática, regulamentada na legislação brasileira, acabou dando origem a uma segunda categoria de coleção Mebêngôkre, caracterizada como coleção biocultural, uma vez que espécimes botânicos aparecem associados a saberes tradicionais, sejam rituais, medicinais, alimentícios, tecnológicos, ornamentais ou para uso doméstico. Da mesma maneira, a cultura material Mebêngôkre continua sendo documentada na Reserva Técnica Curt Nimuendajú, porém, agora selecionada pelos próprios indígenas, que decidem o que e como deve ser preservado.

Nos primeiros momentos, a assimetria caracterizou essa relação. Entretanto, nos momentos posteriores foi possível observar tanto o Museu Goeldi quanto os indígenas envolvidos em movimentos de reconfiguração, pautados por questões políticas, sociais e ambientais. “Na atualidade, essa relação pode ser caracterizada como colaborativa, na medida em que os indígenas são incorporados como pesquisadores nos projetos de investigação. Por outro lado, esses projetos também levam em conta demandas das comunidades onde são executados, isto é, são concebidos e planejados a partir de uma agenda negociada que conflui em responsabilidades e benefícios partilhados”, de acordo com o artigo.

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