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terça-feira, abril 15, 2025
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Como evitar que a Amazônia chegue ao ponto de “não retorno”?

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Irlaine Nóbrega/Diário do Pará – Estudos recentes apontam que a floresta amazônica está próxima de um colapso irreversível, o chamado “ponto de não retorno”. O conceito, também conhecido como ponto de inflexão, foi introduzido pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC), há mais de 20 anos, para indicar o momento em que as consequências das mudanças climáticas serão irreversíveis. O alerta vem de pesquisadores que monitoram o avanço do desmatamento e do comportamento do clima na região, responsáveis por comprometer os ciclos de chuva, a biodiversidade e o equilíbrio climático global.

De acordo com o doutor em Ecologia, Divino Silvério, pesquisador e professor da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), campus Capitão Poço, o conceito de “ponto de não retorno”, ou “tipping point”, está associado à noção de resiliência, a capacidade de recuperação de um sistema depois de uma “perturbação” extrema. Em relação aos ecossistemas globais, o conceito está relacionado ao potencial de recuperação do ambiente natural após episódios ocasionados pelas mudanças climáticas, como em casos de incêndios florestais.

Na linguagem popular, “ponto de não retorno” são como situações que ficam tão sérias e complicadas que não dá para voltar atrás. Dessa forma, quando o nível de “perturbação” é ultrapassado, o funcionamento de um ecossistema muda de forma definitiva e dificilmente retorna às condições anteriores, podendo potencialmente levar a destruição de alguns biomas. “O que determina o ponto de não retorno é a observação de mudança no estado do ecossistema, sendo que após alcançar este limite, a recuperação das condições iniciais não será mais possível. Assim, este novo estado, caracterizado por alterações profundas na estrutura e no funcionamento dos ecossistemas, será permanente, pelo menos de médio a longo prazo. A gente entende que ele ultrapassou esse limiar, esse ponto de não retorno, quando o episódio de perturbação foi forte o suficiente para vencer a resiliência do sistema”, explicou.

RISCOS

Segundo o pesquisador e professor da Ufra, as consequências das mudanças desencadeadas pela degradação da Amazônia envolvem desde a capacidade de conservação da biodiversidade, os estoques de carbono, o regime de chuvas até a manutenção do clima, entre outros fatores. Além disso, o rico bioma nativo, responsável por abrigar 10% da biodiversidade terrestre do planeta, daria espaço a uma vegetação bem mais aberta e aquém da capacidade natural da floresta.

“Falando da Amazônia, uma vez ultrapassado esse limiar, além de perder uma floresta exuberante, rica em carbono e em diversidades de espécies, uma das opções desse estado é que o sistema passa a ser mais degradado, caracterizado por espécies mais diferente, mais transitórias, pioneira. Um tipo de vegetação aberta que é pobre em carbono, pobre em espécies, e o funcionamento desse novo ecossistema perde a capacidade de fornecer uma variedade de serviços que são úteis a manutenção do clima, de toda essa riqueza que existe, como o próprio fornecimento de alimento para a fauna e para as populações tradicionais. É uma diversidade grande de consequências”, afirma.

Pontos no mundo

Um estudo de pesquisadores da Universidade de Exeter, no Reino Unido, apresentado durante a 28a Conferência das Partes (COP-28), em Dubai, apontou 26 pontos de inflexão, com destaque para cinco mais preocupantes: o descongelamento do permafrost (solo congelado do Ártico), colapso dos mantos de gelo da Groenlândia e da Antártica, desaceleração do sistema de correntes oceânicas do Atlântico, morte de recifes de corais e a destruição da floresta amazônica.

Mudanças dependerão de ações globais, regionais e locais

Atualmente, um dos estudos desenvolvidos pelo pesquisador da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) aponta que localidades da Amazônia já se encontram em situação próxima ao “ponto de não retorno”. Uma delas é uma área localizada no Parque Indígena do Xingu, localizada em São Félix do Araguaia, no Mato Grosso, onde o desmatamento em grande escala alterou o clima da região, acarretando em um mês a mais de calor durante a estação mais quente.

“Ao longo dos últimos 20 anos, cerca de 8% da área indígena deixou de ser floresta. Isso ocorreu sem desmatamento, sem corte seletivo de madeira, ou seja, sem uma ação humana direta alterando o sistema. O que observamos é que a mudança do clima associada aos anos de El Niño extremo, resultaram em grandes incêndios que avançaram para as florestas ainda preservadas. Esse estudo mostrou que em uma área de floresta que foi queimada mais de 2 ou 3 vezes, têm grande chance de perder a floresta e se tornar uma área degradada permanente, com pouca possibilidade de recuperação ao longo do tempo, sugerindo que essas áreas estão ultrapassando o ponto de não retorno”, explicou o doutor em Ecologia.

Outro estudo na área ainda mostra que em áreas de florestas sazonalmente alagadas “em situação de seca extrema sofrem com incêndios florestais que podem ocasionar na morte de vegetais, além da eliminação completa do banco de sementes e a diversidade genética. Estudos indicam que elas não conseguem mais recuperar essa degradação. Essas áreas acumulam muita biomassa que não é decomposta, mas que numa seca extrema fomenta o incêndio e elimina todas as formas de regeneração da floresta”, aponta o pesquisador.

Em contrapartida, há outras áreas da Amazônia Legal, de floresta de terra firme, que mesmo sujeitas a fatores de degradação, ainda não estão perdendo a capacidade de resiliência. “Temos exemplos de outras regiões da floresta mais resilientes que conseguem se recuperar, retornando próximo ao estado anterior. Isso ocorre quando a degradação ocorre em regiões com muita floresta, e a intensidade da degradação não é suficiente para eliminar os modos de regeneração, incluindo o banco de sementes, as espécies da fauna que garantem a dispersão das sementes, ajudando assim na recuperação da área degradada”, revela Silvério.

Diante dessa realidade, é preciso evitar que biomas essenciais para vida na Terra sofram mudanças irreversíveis. Conforme o pesquisador em Ecologia, lidar com essas vulnerabilidades de ecossistemas continentais, como a Amazônia, depende de ações globais, regionais e locais. Globalmente falando, o desafio é combater os fatores que geram as mudanças climáticas. A principal chave é a diminuição da queima de combustíveis fósseis, responsáveis pela aceleração do efeito estufa, sucedida pela mudança para um matriz renovável.

“Regionalmente é zerar o desmatamento e a degradação florestal. Estamos falando em ações em grande escala para evitar que os incêndios florestais avancem para as florestas. A exploração madeireira, com corte seletivo, por exemplo, também deixa as florestas mais vulneráveis aos incêndios florestais. Outras ações passam por ações de recuperação ativa em grande escala para recuperar áreas já degradadas. Temos uma grande quantidade de florestas secundárias que podem ser priorizadas para recuperação, em vez disso, estas áreas sofrem com desmatamento recorrente, impedindo que acumulem carbono ao longo do tempo. Por fim, precisamos utilizar as áreas já desmatadas de forma inteligente e sustentável, priorizando formas de usos que são mais compatíveis com a floresta em pé. Em conjunto, estas ações contribuem para a mitigação das mudanças do clima, e contribuem para evitar chegarmos ao ponto de não retorno”, finalizou o docente.

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